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domingo, 1 de abril de 2012

Centenários comemorados por poucos amigos ou convidando todos aqueles que se acham amigos


Cem anos de Nelson Rodrigues, 100 anos da eclosão da Semana de Arte Moderna e 100 anos da morte do Barão do Rio Branco. Estes centenários que ocorrem em 2012 e tão importantes servem não apenas para reparar equívocos nos reconhecimentos de personalidades e movimentos, como também para refletir que rumos tomaram o teatro brasileiro, a arte de modo geral, e a diplomacia.

No Teatro, desconheço qualquer homenagem a Nelson em Fortaleza e no Interior no presente momento. E não é por falta de casas de espetáculos: José de Alencar, Sesc, São José, Shopping Via Sul... são apenas alguns palcos que me vêm à lembrança de imediato. A explicação para que a dramaturgia não tenha obtido maior envergadura é o isolamento da Capital. A cidade mais próxima com população acima de 250 mil habitantes é Sobral. Enquanto isso, Recife, chega a um patamar elevado, pela aproximação com capitais como João Pessoa, Natal, além de cidades importantes como Campina Grande, na Paraíba, e Carpina, em Pernambuco.

Mas isso só justificaria por pouco se falar da dramaturgia de Nelson? Há explicações que não alcanço, mas bem que seria oportuno que se retomassem suas peças, especialmente neste período em que o cinema a teledramaturgia insistem na temática que rende dinheiro fácil e não instiga maior reflexão das classes sociais mais pobres.

O que se aplica para entender a inanição teatral no Ceará estende-se ainda a compreensão da apatia em se debater a Semana de Arte Moderna, um movimento que fez uma semana ter a duração de três dias. Mas o sentido da irreverência, da quebra de padrões e da revolução estão nas suas manifestações originais, em romper com o colonialismo cultural, o academicismo e a tendência de se vencer o eterno complexo de inferioridade diante da Europa, no passado, e dos Estados Unidos, no presente.

Se no caso de Nelson, a justificativa para que se não façam tanto alarde das festas que virão é porque o grosso das comemorações acontece a partir do segundo semestre, em agosto precisamente, no caso da Semana de Arte Moderna e da morte do Barão do Rio Branco, que se celebraram em fevereiro, o impacto ficou restrito a country clubs burocráticos, formados especialmente por mão de obra operária que sobrevive da área cultural, quer na área pública ou privada. Curiosamente, cada vez mais tomando um perfil de que a credencial de acesso, o pré requisito, é a antipatia, o deboche e o desprezo pelos artistas marginais. Infelizmente, o debate não chegou com nenhuma ou quase nenhuma veemência ao meio acadêmico, não obstante o acréscimo nos últimos 10 anos não apenas no número de universidades particulares, como públicas, inclusive chegando ao interior do Estado

Por que tão pouca alusão àqueles que representaram uma nova era para o Brasil na Litetaratura, Teatro, Pintura, Arquitetura e Música? Cadê as referências - e didáticas - de Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Zina Aita, Vicente do Rego Monteiro, Ferrignac (Inácio da Costa Ferreira), Yan de Almeida Prado, John Graz, Alberto Martins Ribeiro e Oswaldo Goeldi,Victor Brecheret, Hildegardo Leão Velloso e Wilhelm Haarberg, Antonio Garcia Moya e Georg Przyrembel, Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, Sérgio Milliet, Plínio Salgado, Ronald de Carvalho, Álvaro Moreira, Renato de Almeida, Ribeiro Couto e Guilherme de Almeida Villa-Lobos, Guiomar Novais, Ernâni Braga e Frutuoso Viana?

Por fim, a confusão de meus pensamentos chega ao Barão do Rio Branco, considerado um herói nacional. O homem que, através da diplomacia, demarcou as fronteiras brasileiras, sem necessidades de guerras, mesmo em áreas de litígios, como foi a questão do Rondônia (cuja Capital leva o seu nome). Gostaria que houvesse mais debates nas universidades para discutir os rumos da diplomacia atual, que ora prega o princípio da não indiferença para opinar sobre a crise na Síria, ora nada diz sobre a supressão dos direitos humanos em Cuba e a ausência de liberdade de expressão na China e também no mundo árabe. Ter cara de poucos amigos não significa ser mais inteligente. Mas também, como disse ontem a Folha de São Paulo, querer ser amigo de todo mundo resulta na perda de respeito.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Engraçadinha encerra publicações que homenageiam Nelson Rodrigues



"Nelson é o maior escritor mundial. Se não fosse o idioma, que bem poderia ter sido o Espanhol, seria consagrado no mundo todo, assim como deveriam ter sido Guimarães Rosa e Machado de Assis". A afirmação é do psiquiatra e escritor Airton Monte, ao prestar sua homenagem no Sobrearte pelo centenário de Nelson Rodrigues.
Segundo Airton Monte, como todo artista esteve muito à frente de seu tempo. Por tanto, não lhe cabe os rótulos de direitista ou racista. "Wagner era racista, anti-semita, mas deixou uma obra fabulosa", compara. No caso do romancista e teatrólogo, diz que a peculariedade  maior na sua bibliografia é a ênfase que deu aos dramas familiares. "Nelson trouxe a família de classe média para dentro da sua dramaturgia ou para suas crônicas", diz o psiquiatra e escritor. Daí que temas tabus como incestos, obsessões, abortos, traições das mulheres e dos homens são recorrentes na vida real até hoje.
Nelson Falcão Rodrigues, dramaturgo, romancista e jornalista brasileiro, nasceu no Recife, PE, em 23 de agosto de 1912. Rui Castro nos conta, em O Anjo Pornográfico, que quando Nelson estava com cinco anos de idade, seu pai, deputado e jornalista do Jornal do Recife, por problemas políticos, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde foi trabalhar como redator parlamentar do jornal Correio da Manhã. Por envolvimento em questões políticas, o pai de Nelson foi preso e o jornal que ele dirigia silenciado pelo governo durante oito meses. Ao sair da prisão, Mário resolveu fundar seu próprio jornal: A Manhã. Foi nesse jornal que Nelson Rodrigues, com apenas treze anos de idade, iniciou sua carreira jornalística como repórter de polícia e esportivo. Além dele, trabalhavam no jornal seus irmãos mais velhos, Milton, Roberto e Mário Filho.
Foi nesse jornal que aconteceu uma tragédia familiar e que marcaria toda a vida de Nelson. A publicação de uma notícia sobre uma mulher que estaria praticando adultério, esta tomada pelo ódio e desejo de vingança adentrou a redação e atirou no seu irmão Roberto. Não valeram as manchetes do dia seguinte classificando a mulher de meretriz. A ferida nunca cicratrizaria.  Pouco mais de dois meses depois, ainda em decorrência da morte do filho, Mário Rodrigues sofre uma trombose cerebral e morre aos 44 anos de idade.

Assim como foi precoce a carreira de jornalista, Nelson também constituiu família muito cedo. Escondido casou-se com Elza. Com os filhos nascendo, tinha que escrever avidamente. Em maio de 1941, Nelson Rodrigues produz sua primeira peça: A mulher sem pecado.
Mantive o primeiro contato com a obra de Nelson da forma errada; através das adaptações de suas peças para o cinema, que incluíam Vestido de Noiva, Toda Nudez será Castigada e A Dama da Lotação (esta com ainda estonteante bealdade Sônia Braga). Mas não se firmavam como cinemas refletores da alma rodriguiana. Pelo contário, atolava o cinema brasileiro ainda mais num nível escatológico e, como era moda na época, na onda pornô soft.




Tempos depois, li seus livros de crônicas e acompanhei pela televisão as versões feitas pela TV Globo. Em cada história, uma tara, uma capacidade inimaginável do instinto dominar o homem. O drama passional percorre quase todas as tramas e muitas vezes a esperança dos protagonistas dá lugar ao desespero ou até mesmo a morte.
Nelson Rodrigues morreu no dia 21 de dezembro de 1980. Dois meses depois, Elza cumpriu o seu pedido de, ainda em vida, gravar o seu nome ao lado do dele na lápide, sob a inscrição: Unidos para além da vida e da morte. E só.

Vestido de Noiva inicia série de homenagens a Nelson Rodrigues



"A mulher normal, equilibrada, é capaz de amar dois, três, quatro ao mesmo tempo. O amor múltiplo é uma exigência sadia de sua carne e sua alma". Essa é uma das milhares (e são milhares mesmo) de frases de efeito de Nelson Rodrigues, que se fosse vivo completaria em agosto próximo 100 anos de idade. Vários movimentos culturais em todo o País estão programando atividades, inclusive reeditando suas obras, que incluem romance, contos e teatro.
Há quem diga que se Nelson Rodrigues falasse um idioma mais conhecido internacionalmente, como o espanhol por exemplo, teria alcançado uma projeção que até hoje não esteve à sua altura. Foi uma das mentes mais férteis de sua geração e ainda não superada. A inteligência de suas assertivas desconcertava a moral da época quando escrevia seus artigos para jornais e os textos para o teatro. Em cada uma delas, havia uma forma de chocar, desestruturar conceitos mas nunca sem uma pitada de coerência."A Europa é uma burrice aparelhada de museus", dizia nos seus ataques anti-colonialistas. "O europeu ou é um Paul Valéry ou uma besta".São frases que tanto angariavam simpatia, quanto inimizades, mas nunca a indiferença. No teatro, viveu tempos de perseguições e hipocrisia. Felizmente, o talento ressurgia e sua voz se tornava mais eloquente do que todo o falso moralismo que se levantava ao contrário.
Nelson Rodrigues teve uma vida muito conturbada, intensa, marcada pela polêmica, pela censura, por casamentos e amantes, pela tragédia, o assassinato do irmão Roberto, a morte prematura do pai, a filha Daniela, cega e com paralisia cerebral, o filho Nelsinho, preso e torturado pelo regime militar, a morte do irmão Paulinho, soterrado com a esposa e filhos, em decorrência de desabamento do prédio onde moravam em Laranjeiras, em fevereiro de 1967 e o suicídio, em dezembro do mesmo ano, de sua cunhada, a viúva de seu irmão Mário Filho.
Em o Anjo Pornógrafico, de Ruy Castro, formou-se um retrato que é apontado dos mais fiéis. Um homem averso à esquerda, embora tivesse um filho preso como terrorista e (por conveniência ou não) considerado como um direitista. Escritor tenaz, chegou a escrever um romance na redação do jornal onde trabalhava, misturando personagens fictícios com reais, inclusive o do escritor Oto Lara Rezende, frequentemente citado em Engraçadinha e na peça Bonitinha, mas ordinária ou Oto Lara Rezende.
Os críticos afirmam que Nelson conseguia expor em suas peças a natureza humana, com domínio do trágico e do grotesco, transmitindo uma visão de mundo quase sempre pessimista e desesperada. Suas peças são consideradas o que se fez de melhor no teatro brasileiro até os dias atuais.
"Nelson Rodrigues ao levar para o palco toda matriz de transgressões, de certo modo salvava a platéia da vivência na carne, deixando-as na latência do imaginário", afirma o escritor e jornalista Carlos Augusto Viana. Daí que do escândalo se transformava em axioma, por mais contudente que pudesse parecer. "O medo mata o desejo, mata o prazer. O palavrão é um estímulo. Na intimidade sexual, a mulher gosta do palavrão". Ou então,
"Não há presidente que não sonhe com os funerais dos chefes de Estado. O defunto presidencial é um exibicionismo ululante".
Hoje, apresento o texto da peça Vestido de Noiva. Amanhã, retomarei outras obras do teatrólogo, que não foi, absolutamente, como dizia: "um autor de muitos originais e sem nenhuma originalidade".

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Adolescentes buscam aventura na prostituição

Teatro

Perdoa-me por me traíres

de Nelson Rodrigues



Primeiro Ato
(Nair e Glorinha estão na porta de Madame Luba, ambas vestidas de
colegiais, uniforme cáqui, meias curtas, cabelo rabo de cavalo, pasta
debaixo do braço. Glorinha vacila e a outra insiste)
NAIR Vem ou não vem?
GLORINHA Tenho mêdo!
NAIR De quem, carambolas? Mêdo de quê?
GLORINHA (Suspirando) — De algum bode.
NAIR Já começa você. Que bode?
GLORINHA Sei lá! (mudando de tom) E se o meu tio sabe?
NAIR Espia: não foi você mesma, criatura, que me pediu pra te trazer?
GLORINHA Pedi, mas... É o tal negócio. Você não conhece meu tio.
NAIR Conheço, até de sobra!
GLORINHA Duvido! Não te contei...
NAIR Um chato!
GLORINHA ... Te contei que, outro dia, só porque cheguei atrasada uma meia hora, ou
nem isso, uns 15 minutos talvez — êle me deu uma surra tremenda? E disse mais: que, na
próxima vez, me mata e mata mesmo!
NAIR Conversa! Conversa!
GLORINHA Pois sim! Eu que não abra o ôlho!
NAIR Mas êle não vai saber! Saber como? (baixa a voz) Só essa vez, está bem?
GLORINHA (Tentada) — Vontade eu tenho, te juro!
NAIR Faz, então, o seguinte, olha: tu entras um instantinho só. Eu te apresento a
Madame Luba que é lituana, mas uma simpatia!
GLORINHA E que mais?
NAIR Tu dizes que, infelizmente, não podes, por isso, por aquilo, inventa uma desculpa.
E cai fora... Mas se não fores, quem fica mal sou eu, porque prometi, batata, que te
levava!
GLORINHA Eu vou, mas fica sabendo: não me demoro nadinha!
NAIR Você não sabe o que quer, puxa!
(Nair e Glorinha na sala de Madame Luba. Em cena, Pola Negri, garção
típico de mulheres. Na sua frenética volubilidade, êle não pára. Desgrenhase,
espreguiça-se, boceja, estira as pernas, abre os braços)